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Quem disse que você tem que fazer terapia?

A seita da terapia obrigatória: tô fora


Bilhetinho escrito à mão: Terapia: 250,00; Vai à merda: 0,00; Certas coisas não têm preço"
Instagram: @bettipellizzer

Outro dia fiz um post no Instagram com uma piadinha boba:

Terapia, R$250

Mandar à merda, R$0,00

Certas coisas não têm preço

Era só isso. Humor. Uma observação cínica sobre o mundo, como tantas que escritores fazem. E mesmo assim, lá veio a patrulha. Uma enxurrada de defensores da terapia como se eu tivesse ofendido uma religião.

Sim, religião. Porque é isso que virou: um novo dogma. Um novo altar onde quem não se ajoelha é visto como negacionista emocional, ingrato com a vida e “muito traumatizado pra perceber que está traumatizado”.

Na legenda, aliás, eu mesma escrevi: “Bilhetinho de escritora não substitui conselho profissional. Façam terapia.” Mas escrevi como quem diz “bebam água” ou “usem filtro solar”. Um conselho genérico, não um mandamento sagrado.

Só que parece que, hoje em dia, tudo precisa de chancela terapêutica. Não basta pensar, sentir, escrever ou errar, tem que ter um terapeuta validando. Um carimbo oficial de que você processou aquilo direito. Caso contrário, você corre o risco de estar vivendo errado.

E é aí que eu me pergunto: Em que momento fazer terapia virou obrigatório?

Exceto por respirar e beber água, não consigo pensar em mais nada nessa vida que seja. Quem foi que nomeou os terapeutas os novos messias da existência? Quem decidiu que só eles detêm a bússola dourada capaz de nos guiar até o equilíbrio?

Eu quero e exijo o direito universal de não fazer terapia. De não confiar em ninguém, o que inclui o terapeuta. De não querer pagar centenas de reais para alguém repetir: “E como você se sente a respeito disso?”

Eu me sinto entediada, doutor .Eu queria estar na academia, ouvindo Tiziano Ferro gritar "di sereeee nereeeee" enquanto tento completar mais uma repetição no supino.

Sim, já fiz terapia. Não sou ignorante sobre o assunto. Mas, honestamente, um treino de tríceps até a falha é muito mais terapêutico e certamente tem resultados mais duradouros que doze sessões de conversa circular sobre memórias que eu mesma já revirava antes de entrar no consultório.

Saúde mental, pra mim, começa com sono regular, comida decente, luz do sol, e silêncio.

Antes de pagar um terapeuta, eu prefiro pagar dentista, ginecologista e até minha podóloga que, inclusive, finalmente conseguiu deixar a unha do meu dedão reta, algo que anos de análise não chegaram nem perto de resolver.

Eu entendo que terapia pode ser vital pra muita gente. Claro que sim. Mas dizer que todo mundo, o tempo todo, precisa fazer é outra coisa.

Isso não é cuidado.

É catequese.

É lobby.

E o dos terapeutas, honestamente, está começando a parecer um pouco demais.

Se você está mal, tente o seguinte: desligue o celular e saia pra andar. Sente-se sob sol. Treine até suar. Durma melhor. Pague o premium do Spotify e escolha uma playlist que te faça sentir que ainda existe beleza. Depois, chame alguém em quem você confia — um amigo de verdade, mãe, irmão, sei lá — e desabafe. Deixe essa pessoa xingar você, falar umas verdades. Escute. Sinta. Selecione o que ressoa em você.

Se ainda sobrar alguma coisa que você não consegue digerir, escreva num caderno. Fale num vídeo. Grite sozinho dentro do carro. Faça o seu próprio ritual de sobrevivência. E aí, se nada disso resolver, aí sim, procure um terapeuta.

Mas vá sabendo: eles também são gente. Também têm trauma mal resolvido. Também erram, se projetam, falham.

Terapeutas não são oráculos. São prestadores de serviço.

Como eu.

Como você.

E se um post inofensivo na internet os incomoda tanto, talvez eles é que estejam precisando de terapia.

Quanto a mim, me deixem aqui com meu desequilíbrio, que é só meu.

Me deixem correr, suar, levantar peso, desafinar no carro, e chorar ouvindo Tiziano. Se eu agir motivada por meus traumas, serão os meus. Não os que um estranho qualquer resolveu diagnosticar por tabela.

Terapia? Talvez. Mas só depois da minha série de tríceps.

Se o mundo parar de girar e se esquecer de mim (quem entende Tiziano Ferro vai sacar) quero ser encontrada suando, sem dividir meu trauma com ninguém, nem comigo mesma.

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